NEOARQUEO
31 agosto 2009
  Por Terras de Travanca de Tavares

Travanca de Tavares é uma das várias freguesias do nosso concelho. Fica no denominado “alto concelho”, na margem esquerda do rio Ludares.
Travanca, em princípio, deriva do latim “trabanca” que significa floresta cerrada, de árvores troncosas. Quanto a Tavares é do conhecimento de todos que na Idade Média aquelas terras do alto concelho eram as “terras de Tavares”.
Historicamente Travanca de Tavares teve ocupação humana desde tempos remotos. Os vestígios pré e proto-históricos são desconhecidos ou escassos, pese embora em consultas bibliográficas sejam já referidos vestígios da cultura castreja, isto é: povoados dos povos que antecederam os romanos, provavelmente da grande tribo dos “lusitanos”.
Alerto para o facto de neste momento estar a utilizar o termo “lusitanos” de uma forma lata e sem o rigor histórico-arqueológico exigido, pois este texto não é definitivamente um artigo para pares, mas destina-se sobretudo a quem da sua terra um pouco mais quer saber. Mas, o facto de não serem conhecidos vestígios destas remotas épocas não implica, de todo, que o território geográfico desta freguesia não tenha “conhecido” homens de épocas remotas.
Mas, na época romana, a paisagem das terras de Travanca de Tavares era composta por alguns aglomerados daquele período histórico.
Assim, em Travanca de Baixo, no Casal e na Quinta da Caniçada registam-se alguns desses vestígios que atestam a presença da romanização destas paragens.
Começando pelo primeiro lugar, nos terrenos de um antigo solar, hoje em ruínas, junto à Igreja de São Salvador são vários os fragmentos de cerâmica de construção e doméstica. São visíveis, inclusivamente, alguns elementos arquitectónicos que foram reutilizados na construção do referido solar e em seu redor: fustes de colunas, uma cornija e pedras almofadadas.
No Casal foi referido pelo meu colega e amigo Dr. Luís Filipe Coutinho, o aparecimento de telhas romanas e uma mó manuária. Também diversos materiais cerâmicos de construção romana foram referidos na Quinta da Caniçada.
Estes vestígios provam, inequivocamente, a presença da ocupação romana nestas paragens. A paisagem da época deveria constituir-se por uma Quinta e diversos casais á sua volta. A terra, a agricultura, terão sido, certamente, o ponto fulcral da atracção das pessoas de então.
É importante referir, também, a existência de um sarcófago de granito no adro da Igreja. Este túmulo foi descoberto aquando da construção do muro que define o recinto religioso. Trata-se de um arcaz apresentando interiormente a forma antropomórfica, destinado a um adulto, tendo em conta as dimensões que exibe. A medievalidade de Travanca está aqui bem patente.
Podemos então, à guisa de conclusão, afirmar que Travanca de Tavares teve ocupação humana desde pelo menos tempos romanos, prolongando-se pela Idade Média e continuando até aos dias de hoje.
 
24 agosto 2009
  As RELIGIÕES DA LUSITÂNIA

A religião é intrínsecamente antrópica. Faz parte da genética humana. Desde tempos pré-históricos. São vários e abundantes os testemunhos arqueológicos, históricos, e outros que assim o provam. Naturalmente que o Homem tem por opção - opção é uma condição exclusivamente humana - não ter religião, não acreditar, não praticar. A religiosidade é incalculavelmente mais antiga que a a não-religiosidade, colocando as coisas neste plano muito linear e sem preocupações de ordem filosófica ou antropológica.
José Leite de Vasconcelos, o Pai da Arqueologia em Portugal, interessou-se sobremaneira por estas questões nos finais do século XIX. A vasta colecção que este insígne mestre deixou no Museu Nacional de Arqueologia, em Lisboa, é o resultado das imensas viagens e recolhas que fez.
Na colecção do MNA posdemos encontrar o monumento que está na foto. Trata-se de uma ara (altar)romana, em granito e que foi consagrada a NABIA, por Cícero, filho de Mancius. Data do século I d. C. e é proveniente de Roqueiro, Sertã, Distrito de castelo Barnco.
Mas, na obra que Leite de Vasconcelos escreveu, "RELIGIÕES DA LUSITÂNIA", o autor interpreta magnificamente o pensar e o agir religioso do homeme antigo. Diz assim:" Entrar num bosque, rico de árvores seculares e gigantescas, onde a grandeza dos vegetais causa espanto, e as próprias sombras infundem mistério, era para os antigos(...)fonte de sentimento religioso".
Mais escreve: "Em virtude da admirável propensão do homem para a personificação e mesmo às vezes dramatização, quer dos grandes espectáculos naturais, como o giro dos astros, as mudanças da atmosfera e das estações, a agitação dos mares, os vulcões, os terramotos, quer dos fenómenos, do crescimento das plantas, da vida dos animais, tão semelhante à dele, do deslisar, ora pacífico, ora tumultuoso dos rios, e do marulho sempre suave das fontes, não é de estranhar que entre os cultos antigos se encontre, ao lado do das correntes fluviais, (...) também o das Fontes".
As considerações e interpretações que o autor faz das antigas formas de religião não se esgota nestes dois excertos. No entanto, são suficientes para perceber em que medida o Homem, ao longo dos tempos, foi fazendo evoluir as sua própria forma de religiosidade e levar-nos a reflectir se nos dias de hoje essa religiosidade se mantém inalterada, ou não, quanto ao conteúdo e quanto à forma e rituais.
 
09 agosto 2009
  Faz sentido apostar num Turismo Cultural para Mangualde?

Não sou nem tenho formação académica ou específica em Turismo. Este tema, hoje verdadeira Indústria que gere milhões e milhões de euros, dólares e yens, constitui uma nova área do saber. Existem nas Universidades portuguesas e estrangeiras cursos de Licenciatura e cursos de Mestrado.
Os conhecimentos sobre este tema advêm-me da transversalidade que hoje é inevitável entre o Turismo e o Património Cultural.
Na realidade, em tempos passados, entendia-se que o Turismo e Património Cultural tocavam-se algures, sobretudo devido a alguma boa vontade dos agentes turísticos e a uma mesma dose por parte dos cuidadores do Património Cultural. O pressuposto era que o Turismo poderia também aproveitar o Património Cultural e vice-versa. Porém esta perspectiva, pelo menos no nosso país, era algo incipiente.
Independentemente das componentes próprias e específicas do Turismo e do Património Cultural, hoje a consciência sobre a sua conjugação, sobre a sua transversalidade é levada muito a sério.
E não são apenas os agentes de intervenção turística ou os agentes de intervenção do Património Cultural que encaram esta problemática desta forma.
Hoje em dia são os poderes públicos, os governos, as autarquias, as regiões de turismo que conjugam esforços no sentido de promover uma indissociável ligação entre Turismo e Património Cultural.
Na génese desta questão podem estar, e estão, vários factores, mas aquele que se torna mais evidente e visível é a vontade de aproveitar as hordas de turistas culturais que viajam pelo mundo em busca de cultura.
Academicamente há quem defenda que só se pode falar verdadeiramente em “turismo cultural” desde que o turista esteja num determinado sítio, numa dada comunidade por um período mais ou menos longo de tempo; isto para que seja possível ao “turista” apreender a essência, a verdadeira realidade da cultura daquele sítio, daquela dada comunidade.
Ficaria, nesta visão, de fora um simples fim-de-semana a Piódão, a ver a aldeia de xisto. Percebe-se porquê: um fim-de-semana não é suficiente para a tal apreensão da verdadeira essência cultural da paisagem natural e humana daquela belíssima aldeia do nosso Portugal profundo.
Esta visão deixaria também de fora um fim-de-semana a Lisboa e uma consequente visita ao Museu Nacional de Arte Antiga ou dos Coches.
Estes são assuntos que na realidade interessam debater, mas serão sem dúvida os investigadores e ideólogos destas matérias que o terão que fazer, baseados evidentemente na observação da realidade e dos contributos que os rodeiam.
Parece-me todavia mais importante, obviamente numa perspectiva mais leiga e menos académica, que o importante é de facto que esse “Turismo Cultural” aconteça. Não me importa muito se dura um fim-de-semana ou quinze dias…
Elaboremos no seguinte raciocínio: Mangualde tem um vasto Património Cultural. Entenda-se aqui, e sempre que utilizar o termo, o conceito antropológico de Património Cultural, materializado sob as mais diversas formas e também na forma imaterial, correspondente a um conjunto de práticas culturais identitárias de um povo ou comunidade e que se traduzem por saberes-fazer, tradições.
Como dizia, o nosso concelho tem esse Património Cultural próprio, único para oferecer a quem o demande. Serão os portugueses de outras paragens e serão os estrangeiros que de longe o poderão vir visitar.
Naturalmente que esse Património Cultural terá que estar devidamente preservado, salvaguardado e valorizado. Ninguém gosta de ver uma Igreja do Século XVII ou XVIII em péssimas condições de salvaguarda; ninguém gosta de visitar um qualquer monumento e dar de caras com ele a cair, ao abandono, em degradação, sem condições de ser condignamente visitado.
Os turistas culturais gostam de observar, de ver “maravilhas” arquitectónicas, ruínas arqueológicas, monumentos megalíticos, igrejas onde no seu interior possam admirar um altar-mor todo ele construído no mais belo barroco, uma lindíssima talha dourada.
Os turistas culturais gostam de visitar palácios, solares, conjuntos arquitectónicos cuja beleza, raridade ou até simplicidade testemunhem uma verdadeira mais – valia cultural.
Os turistas culturais gostam de visitar museus, centros de arte, gostam de ver peças de teatro, óperas, espectáculos de carácter popular e etnográfico.
Enfim o turista cultural gosta de levar um pouco consigo dos sítios que visita, seja através da máquina fotográfica ou de filmar, seja na sua própria memória.
Claro que nós por aqui, pelas terras de Mangualde não temos tudo o que o turista cultural gosta de ver e visitar.
Mas, temos o que temos e aquilo que possuímos deve estar preservado, salvaguardado, valorizado para que o possamos “oferecer” ao turista que nos procura. É a qualidade da nossa oferta patrimonial e cultural que faz o turista cultural demandar as nossas terras e, uma vez chegado à sua terra, ao seu país, após o tal fim-de-semana ou após os 15 dias que passou na região poder ser o arauto, o maior veículo de promoção e divulgação das nossas terras.
Não me canso e, por outro lado compete-me, numa lógica de interveniente activo no espectro do Património Cultural, particularmente do concelho que me viu nascer e crescer, de referir que as políticas culturais do nosso concelho terão de passar obrigatoriamente por uma gestão sustentada e estruturada na salvaguarda e na preservação do Património Cultural. Os objectivos são claros: preservar o nosso passado, a nossa identidade, os nossos valores culturais, as nossas tradições, a nossa etnografia, a nossa vivência actual (fundamentada e cimentada na genética própria enquanto comunidade identificada em torno de um dado conjunto de práticas e valores culturais e de realizações).
Não me canso e, pelas mesmas razões acima aduzidas, de referir a importância da criação de um Museu Municipal que albergue em rigor todos os “vestígios” do passado e do presente do nosso concelho.
Já o referi, por diversas vezes: não faz sentido a criação de um museu reduzido a uma só temática. Não faz sentido “reduzir” a Cultura (antropologicamente falando) a um único tema.
Mangualde vai muito para além do estritamente arqueológico, do estritamente histórico, do estritamente etnográfico, do estritamente rural, do estritamente artístico, do estritamente industrial…
Mangualde resulta de uma amálgama cultural diversificada e é nessa diversidade que devemos encontrar as nossas raízes identitárias, aquilo que numa era de globalização nos torne únicos.
Mas, não pensem que me desviei do tema proposto. Não.
O Património Cultural, as diversas práticas culturais e de lazer, a criação de um Museu em Mangualde servem em primeiro lugar os mangualdenses, mas em última análise servem os propósitos do Turismo Cultural.
Mangualde só pode beneficiar e desenvolver apostando nesse Turismo Cultural.
É que…para além do que mais se possa dizer, o Turismo Cultural está em crescendo a nível mundial e não está sujeito a sazonalidades.
Tanto faz a um turista cultural visitar Mangualde na Primavera, no Verão, no Outono ou no Inverno.
E para nós, mangualdenses, hoteleiros, donos de restaurantes, donos de pensões e residenciais, produtores de produtos tradicionais e regionais, donos de cafés e bares, artesãs dos bordados de Tibaldinho, etc., etc., etc.… é-nos indiferente receber com o tradicional bom acolhimento esses turistas em qualquer altura do ano.
 
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